quinta-feira, 4 de maio de 2017

O ensino profissional

            Há «dias» para tudo. E ainda bem, porque, assim, pelo menos nesse dia, o tema pode ser aprofundado.
            Descobri, ao tomar o pequeno almoço de 3 de Abril, p. p., que nesse dia se comemorava o Dia do Ensino Profissional e, vai daí, assisti à apresentação de estatísticas e mais estatísticas, opiniões a favor e contra, sugestões, relatos de experiências, propostas de iniciativas e de legislação e o Governo: que sim, que no Ensino Profissional estava a chave da porta do futuro – e a gente que nem sabe onde é a porta, quanto mais onde é que está a chave!...
No ano lectivo de 1963-1964, exerci funções de professor do Ensino Preparatório na Escola Profissional de Santo António, Izeda (Bragança), uma escola dependente dos Serviços Tutelares de Menores e entregue à Congregação Salesiana. Ensinei Português e Ciências Naturais a quem seguia uma formação técnica. Quando, em 1968-1969, comecei a leccionar na Escola Técnico-Liceal Salesiana do Estoril, tive, além de outras, duas turmas de História do 2º ano do Curso Comercial. A escola era mesmo técnico-liceal; ou seja, após a instrução primária, o estudante ia para o ensino preparatório, que lhe daria acesso aos cursos da Indústria ou do Comércio, ou para o ensino liceal, e seguia uma carreira que poderíamos designar de «Letras».
Cruzo-me, ainda hoje, amiúde com esses meus antigos alunos do Curso Comercial, porque boa parte deles criou as suas empresas e seguiu vida por aqui, na «linha de Cascais». Gente, de um modo geral, organizada e com os pés assentes na terra, porque detentora de cursos concretos, profissionais.
Creio que foi com as reformas do ensino subsequentes à Revolução de Abril que se acabou com esses cursos e deixou de se chamar Escola Industrial Marquês de Pombal a um estabelecimento de ensino da zona de Alcântara que formava técnicos bem competentes (ter andado na Marquês de Pombal era um orgulho!). Lembro-me que também resolveram ‘transformar’ a Francisco de Arruda, também de ensino preparatório, em Alcântara – «uma ‘escola de referência’, como a classificou Maria Emília Brederode Santos no Jornal de Letras (11-12-2013) – o que levou o Prof. Calvet de Maglhães, um pedagogo de primeira água, que tudo dera àquela escola, a achar que já não valia a pena viver, quando lhe impuseram essa ideia «revolucionária» de acabar com o ensino profissional.
Hoje, torcem a orelha e já não deita sangue. Porque será que, quando alguém chega ao poder, a sua primeira acção é destruir o que de bom os anteriores gestores haviam feito? Claro, agora pugna-se ardentemente pelo ensino profissional. Vão ver o que, há 50 anos, funcionava bem e foi estraçalhado! Nalgum sítio deve haver ainda arquivos disso – se é que não decidiram queimar tudo!

                                                      José d’Encarnação

Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 707, 1 de Maio de 2017, p. 11.

7 comentários:

  1. Caro prof.
    Nos anos sessenta não havia Escolas Preparatórias; chamavam-se Escolas Técnicas Elementares. Eu frequentei a Escola Técnica Elementar Francisco Arruda (a ETEFA) nos anos letivos de 1967-1968 e 1968-1969, onde conheci o prof. Calvet de Magalhães. Seria a Reforma Veiga Simão, começada no ano seguinte, que transformaria as escolas técnicas elementares (ETE) em escolas preparatórias. Foi o princípio do fim do Ensino Técnico. As ETEs preparavam, em dois anos, os alunos para o Ensino Técnico (industrial e comercial), que durava mais três anos.(No meu caso 4 anos porque decidi frequentar o curso de Montador Radiotecnico da Escola Industrial Fonseca Benevides, um pouco mais abaixo no Largo da Calvário, em Alcântara). Aos 16, 17 um jovem tinha de facto competências práticas que lhe garantiam trabalho na indústria ou no comércio. O problema era o acesso ao ensino superior. Quem fosse mais ambicioso só poderia frequentar o chamado ensino médio: os Institutos Industriais ou Comerciais que atribuíam o título de Agentes Técnicos. Eu entrei no Instituto Industrial de Lisboa, em 1973 para o curso de Agente Técnico de Engenharia eletrónica. Em 1974, com o 25 de Abril, acabou o Ensino Médio e os institutos Industrias (e comerciais) passaram a Institutos Superiores ( O Instituto Industrial passou a Instituto Superior de Engenharia): Comecei o curso no Instituto Industrial e terminei-o no Instituto Superior de Engenharia.
    Os cursos técnicos eram de facto muito bem desenhados, adaptados às necessidades da indústria. Seio-o pelo meu filho. Ele é aluno do curso de engenharia de eletrónica, telecomunicações e computadores do Isel, o instituto onde há cerca de 40 anos terminei o mesmo curso (salvo os " computadores"). Ele põe-me questões, dúvidas sobre diversas disciplinas do curso, designadamente as disciplinas ligadas à concepção e leitura de circuitos (Fontes de tensão, resistências, bobinas, condensadores, amplificadores operacionais, transistores, etc.), e, apesar, de já não ter nada a ver com engenharia há mais de 30 anos (tornei-me, entretanto economista), respondo-lhe certeiramente quase de imediato, ou vou à net para relembrar. E ele devolve, com razão, "sabes isso, não do ISEL, mas do curso de Montador Radiotecnico da Fonseca Benevides, essa é a tua vantagem". É verdade, o meu filho aprende no ISEL aquilo que eu aprendi na Fonseca Benevides entre os 13 e os 17 anos. O curso técnico era muito prático. Tinha-mos muitas oficinas (de serralharia, eletricidade, de eletrónica, de radioreparação) que nos permitiam montar e reparar circuitos (rádios). Fazíamos à mão resistências, bobinas, transformadores, dispositivos elétricos que os alunos do ensino superior de agora nunca farão.
    As perguntas do meu filho fazem-me sentir um engenheiro (coisa que desconfiava já não ser). E isso deve-se muito ao meu curso de Montador Radiotecnico.
    Agora, em Portugal ou se é engenheiro ou não se é nada. É urgente voltar ao ensino técnico- proporcionar uma competência técnica, procurada pelas empresas, a umjovem de 17 anos.
    Abraço,
    José Soares

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  2. Jose Adelino Correia
    É bem verdade Professor!!

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  3. Isabel Maria Luciano
    Exactamente.Foi um dos grandes erros no sistema de ensino pós 25 de Abril.

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  4. Nuno Santos Pinheiro
    É, de facto, inqualificável, até por razões de delicadeza!!

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  5. Rosário Correia
    Em vez de fazerem melhor que os outros, preferem destruir o que os outros realizaram.

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  6. Neyde Theml
    Pior! Que os novos políticos gabam-se de criadores, inventores de coisas antigas... Abaixo do equador ė assim...

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  7. Domingos Barradas 5/5 às 1:51

    A abrilada/74 destruiu propositadamente tudo o que de bom existia antes e, demagogicamente, propalam que desmantelaram o fascismo e fundaram a democracia, quando esta, de facto, nunca existiu, mas sim uma oligarquia partidária e cleptómana e aquele (fascismo) não passou de uma mera proibição - plenamente justificável, aliás, - da infiltração do perverso comunismo soviético que tanta desgraça causou e continua a causar à humanidade, destruindo países, outrora prósperos e pacíficos e liquidando milhões de seres humanos. SALAZAR TINHA RAZÃO.

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