quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Um alerta sobre o Paço Real de Caxias

            Sob o título «Palácio sob tutela militar vandalizado e a cair aos bocados em Caxias», publicou José António Cerejo, na edição do passado dia 22 do jornal Público, uma reportagem que vem na sequência de o movimento cívico denominado Fórum Cidadania Lisboa, ao tomar conhecimento da situação, não ter hesitado em enviar, no dia anterior, ao ministro da Defesa, Azeredo Lopes, uma carta a pedir esclarecimentos e a perguntar se já se pensou no assunto.
            Claro que o senhor ministro, recém-empossado, terá respondido que o seu ministério estava agora a estudar esse e outros casos pendentes, uma vez que a hipótese, que se pusera em 2012, de alienação do imóvel ficara sem consequências práticas.
            Classificado, em 1953, como imóvel de interesse público, esse «pequeno palácio» «mandado construir por D. Francisco de Bragança, irmão de D. João V» é, agora, continua o articulista, «um casebre imundo, abandonado, vandalizado, saqueado, à beira da ruína».
            «Convivi» com o palácio em 1971, quando prestei serviço militar no Centro de Estudos Psicotécnicos do Exército ali ao lado; lembrava-me de, após a recuperação dos jardins do paço levada a efeito, em 1986, pela Câmara de Oeiras, ali ter assistido a um bem agradável jantar que terminou por bonita girândola pirotécnica numa das fontes (salvo o erro); e porque sabia estar o meu colega e amigo Carlos Beloto ligado, de certo modo, ao local, quis saber a sua opinião a esse respeito.
            Respondeu-me que «longe de discordar da necessidade de se recuperar o património e, em particular, a Quinta Real de Caxias na qual se integra o Paço Real», poderia aproveitar o ensejo para me dar alguns esclarecimentos acerca da história da Quinta, o que muito lhe agradeço.
            Assim:
            1. Os jardins e cascata foram iniciados, em 1775, pelo príncipe D. Pedro de Bragança, mais tarde D. Pedro III pelo casamento com D. Maria I. O citado D. Francisco de Bragança havia morrido em 1742.
            2. O Paço começou a ser construído em Agosto de 1785. É, portanto, uma obra 30 anos posterior ao terramoto de 1755.
            3. O Paço serviu para apoio à Família Real nas suas deslocações a Caxias, quer para assistir à partida dos grandes barcos para a Índia ou Brasil, quer para assistir às vindimas ou aos muitos jantares, lanches e festas de que temos notícia. Depois do regresso da Corte do Brasil, o Paço passou a ser residência temporária dalguns personagens ligados à Corte, como, por exemplo, a Imperatriz (mulher de D. Pedro IV), a sua filha, o próprio rei D. Luís, enquanto o Palácio da Ajuda não ficou habitável.
            4. Quanto à classificação, é bom referir que só foram classificadas duas salas do piso intermédio, ou seja, o salão nobre e o quarto da Imperatriz.
            5. Acrescente-se que foram feitos, a partir de 2007, estudos e investigações que permitiram descobrir as telas pintadas das duas dependências classificadas, que, a expensas da Câmara Municipal, se fotografaram em alta resolução, material que se encontra pronto para publicação.
            6. Simultaneamente, um grupo de voluntários coordenados pelo próprio Carlos Beloto procedeu ao levantamento de todo o edifício em autocad.
            7. Embora, de facto, o aspecto geral do interior seja deprimente, a estrutura do imóvel mantém-se em bom estado de conservação, graças à reparação total do telhado, executada nos anos 70 do século passado.
            8. Tem-se consciência de que a documentação que era importante se conseguiu salvar e estão, de facto, a ser equacionadas propostas de programa em colaboração com a Câmara Municipal de Oeiras; contudo, enquanto se mantiver pendente a questão da posse do edifício, eventualmente para o Município, não são muito largas as passadas que é possível dar.
            Por isso, todos os alertas não são de somenos a fim de as entidades competentes se consciencializarem da realidade e venham a adoptar medidas para se preservar e valorizar um património arquitectónico e artístico que enobrece Caxias.

                                                                                  José d’Encarnação

Publicado em Cyberjornal, 31-12-2015:

5 comentários:

  1. Sempre atento....!Pois já visitei os jardins e as fontes...mas o palácio não ...A C.M:O. recuperou os jardins...continue agora com o palácio. Nós por cá temos o edifício do Cruzeiro...para mim tem mais valor...o sentimental!

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  2. Margarida Lino
    31/12 às 16:31
    Esperemos que se resolvam as obras rapidamente antes que tudo se desmorone.

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  3. Pepita Cardoso
    31/12 às 23:31
    Até mesmo o parque, que há algum tempo foi arranjado, estava muito abandonado a última vez que lá estive, em Outubro. Bancos, lagos e estatuetas sujos e a deteriorar-se. É uma pena.

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  4. Eugénio Sequeira [ eugenio.sequeira@sapo.pt ], em comentário ao que se escrevera, aproveitou o ensejo, em e-mail de 1 de Janeiro de 2016 19:56, para fazer uma comparação entre o que a Liga para a Protecção da Natureza está a fazer em Castro Verde, um trabalho notável, que merece o maior aplauso e divulgação e, de seguida, como trabalhou na Estação Agronómica Nacional, em Oeiras, não quis deixar de salientar que não fora a actividade de protecção do ambiente cuidadosamente desenvolvida a montante do Paço Real de Caxias, não apenas este mas também outros já teriam desaparecido.
    Agradeço-lhe a colaboração e bem oportuna chamada de atenção.

    «Se te disser que quando fomos para lá [Castro Verde] trabalhar em 1995, havia 1 hotel (apartamentos para caçadores) e uma pensão rasca, e hoje há 3 hotéis, 3 pensões, uma pousada, 7 turismo de habitação (ou turismo rural), só porque se melhorou o ambiente, e, em vez de 200 abetardas e 150 casais de falcões… há 1900 abetardas, cerca de 900 casais de falcões, etc… o que aconteceria se se salvasse o património construído, como o paço real, os jardins, as paisagens e se divulgasse esse património???
    É uma questão de cultura, de reconhecer o que temos, de o defender e divulgar. É uma questão de cultura.
    Se não fosse a Estação Agronómica Nacional, a Gulbenkian, o INA [o então Instituto Nacional de Administração], etc., Oeiras já só seria casas de má arquitetura e as cheias (ali já eu ia morrendo, na cheia de 1967, quando, com a minha mulher e um filho, fui arrastado pela cheia mais de 2 km!...) já teriam destruído a Quinta e o Palácio do Marquês!».

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