sexta-feira, 8 de maio de 2015

O altar a Triborunnis [Incursões (10)]

            Data de Dezembro de 2012 a minha anterior colaboração para o Ecos do Costa. Congratulo-me, pois, com o anunciado recomeço desta publicação, que eficazmente ajuda a congregar sócios e colaboradores em torno de um projecto comum.
            Sempre a temática cultural foi timbre desse projecto e a minha colaboração tem ido no sentido de dar a conhecer monumentos romanos do concelho que, pelas suas características, possam despertar interesse. É a Epigrafia a minha especialidade e, por isso, nesse domínio me situo. E, para recomeço, nos primórdios de um ano, em que se fazem votos de bem-estar, a primeira ideia que me ocorreu e que ora partilho é a de referir o achado, na villa romana de Freiria (S. Domingos de Rana), de um altar com a seguinte inscrição nele gravada:

TRIBORVNNI ·
T · CVRIATIVS ·
RVFINVS ·
L · A · D ·
 
            Trata-se do que chamamos um ex-voto, ou seja, em resultado de uma promessa ou fruto de uma pulsão íntima, alguém consagra a uma divindade um objecto, neste caso, a miniatura de um altar de sacrifício, fundamentalmente para obter a protecção divina.
            Como frequentemente acontece nas inscrições da actualidade, há palavras que vêm em siglas, não só para se poupar espaço (e consequente diminuição do custo da encomenda), mas também porque se trata de palavras facilmente compreensíveis no contexto. Assim, a primeira tarefa do epigrafista é fazer o desdobramento dessas siglas, para apresentar depois a respectiva tradução:

            TRIBORVNNI / T(itus) · CVRIATIVS · / RVFINVS · / L(íbens) · A(nimo) · D(edit) ·

            A Triborunis. Tito Curiácio Rufino ofereceu de livre vontade.

            Que estará, portanto, ‘por detrás’ destas singelas linhas?
            Reservando para outra oportunidade a reflexão sobre o nome da divindade e sobre a identidade do dedicante, direi que interpreto desta forma este monumento: aqui chegado, vindo mui provavelmente da Península Itálica, logo nos primórdios do século I da nossa era, Tito Curiácio Rufino verificou que este era um bom local para se estabelecer com os seus familiares. Não ousou, porém, mexer na terra sem pedir a prévia autorização à divindade que, em seu entender, a protegeria. Terá perguntado o nome aos indígenas que por aqui já viviam. Percebeu Triboruni, palavra que nunca ouvira, mas lá mandou gravá-la assim mesmo na miniatura de altar que desejava oferecer.
            Cumprido o ritual, estabeleceu-se em Freiria.

                                                                                  José d’Encarnação

Publicado em Ecos do Costa (Boletim Informativo do Clube Desportivo da Costa do Estoril), nº 31, Abril 2015, p.11.

 

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