sábado, 18 de outubro de 2014

Quintandona - E a aldeia ressuscitou!

            Multiplicam-se, felizmente, as iniciativas tendentes a evitar a desertificação do interior, tão facilitada ela está pelas medidas irracionais que, comandadas pelos interesses económicos estranhos aos países, os governos estão a ser obrigados a tomar. Iniciativas que se torna urgente serem conhecidas e aludidas.
            É o caso de Quintandona, na freguesia de Lagares, Penafiel. Belmiro Barbosa foi presidente da freguesia durante mais de 30 anos e teve como uma das principais preocupações manter a identidade local, nomeadamente não permitindo novas construções e facilitando a reconstrução das casas existentes, mantendo a antiga traça e utilizando os materiais tradicionais (a pedra à vista, por exemplo).
            O resultado está patente, por exemplo, em Quintandona, uma aldeia hoje ressuscitada com tudo o que lá era tradicional e onde apetece viver!
            Tive ocasião de lá jantar, na Casa da Viúva, num ambiente deveras familiar, no passado dia 26 de Setembro, no âmbito do II Encontro de História e Património do Museu Municipal de Penafiel.
            Saboreei a ‘sopa da avó’, acompanhada de broa de milho, pão de trigo e azeitonas miúdas bem temperadas. Deliciei-me com um divinal bacalhau com broa na travessa em que fora ao forno, e um arroz de carqueja de comer e chorar por mais. À sobremesa, sopa seca, a «sobremesa» dos pobres, porque servia para aproveitar o pão duro, que é assim como que uma espécie de rabanadas, mas feita com o pão de cacete com, pelo menos, dois dias (o «pão dormido»…), cortado às ‘rodelas’… É de ver a receita na Internet, para se compreender melhor! No final, um cafezinho de cevada, como há muito não bebia e, a ‘rebater’, um cálice de… «mijo do jebo», que é como quem diz, um bagacinho com virtudes mui específicas! O jebo, diga-se desde já, é personagem principal da anual ‘Festa do Caldo’. A forma correcta de escrever é gebo; recorde-se a obra O Gebo e a Sombra, de Raul Brandão, de 1923, que o génio imparável de Manoel de Oliveira verteu para filme, estreado no Festival de Veneza de 2012.
            Bem andaram, pois, as autarquias penafidelenses (a freguesia de Lagares, com o apoio da Câmara Municipal de Penafiel) em nos mimosearem com tão feliz promoção.
            Quintandona vai ser um pólo do galardoado Museu de Penafiel e a Doutora Teresa Soeiro compendiou as linhas mestras do projecto no livro Quintandona – as muitas vidas de uma aldeia (1ª edição, Dezembro de 2013, ISBN: 978-989-95308-6-7).
            Em 80 páginas, profusamente ilustradas, conta como «uma aldeia como as de antes» (o lugar, a casa de habitação, os anexos e os equipamentos, os campos, a gente), aceitou «despertar para o novo milénio» (a Festa do Caldo e da Música Tradicional de Quintandona, a Associação CasaXiné e Centro Cultural, alojamento e restauração).
            Não fiquei com os dados da Festa do Caldo deste ano. Faz-se em Setembro e começou em 2007. Contou-me Belmiro Barbosa que, por exemplo, todo o espaço disponível foi ocupado por tendas de campismo. Mas Teresa Soeiro dá conta (p. 71) da estatística de 2012: 14 000 visitantes, 120 voluntários, 52 expositores (artesanato e produtos locais), 33 espectáculos, 6000 tigelas de papas e caldos, 700 doses de sopa seca, 15000 doses de feijoada, 11 porcos no espeto, 190 quilos de broa!…
            É obra! A mui calorosamente aplaudir e… a ir ver!
 
 



Publicado em Cyberjornal, 16-10-2014:

Sem comentários:

Enviar um comentário