quarta-feira, 16 de julho de 2014

Ainda o património cultural – o olhar perspicaz!

            Permita-se-me que volte a referir-me ao recente livro de António Tavares, em que se propõe orgânica, que reputa eficiente, para se salvaguardar o património cultural de um concelho, no caso concreto o de Mangualde.
            Já sublinhei que, mais do que a criação de uma específica ‘secção’ camarária, o que a mim me interessa é que a Cultura continue a deter papel relevante, nas preocupações dos executivos de câmaras municipais e de freguesias. Que não seja mais um pelouro a acrescentar ao das escolas, da segurança social, do desporto… Bem sei que não há vereadores que cheguem, até porque se está a adoptar, cada vez mais, a política de só dar pelouros aos correligionários e também a de os vereadores da oposição se recusarem a receber pelouros. Não estou a referir-me expressamente a Mangualde, entenda-se, mas ao geral do País e ao paradigma europeu vigente. O que eu quero frisar é que o lugar da Cultura deve ser especialmente acarinhado – e creio não ser necessário explicitar porquê.
            A segunda reflexão que o livro de António Tavares me sugeriu advém do motivo escolhido para a capa: a fotografia de um valado, onde, em determinado momento, foram utilizadas duas estelas antropomorfas, possivelmente modernas, que o autor, aliás, já estudou (Beira Alta, LXX, 2011, p. 159-172), após um olhar perspicaz as haver identificado. Para dois aspectos desejo chamar a atenção.
            ‒ O primeiro, esse, de que não é raro vermos pedras antigas, com grande significado histórico, serem aproveitadas em novas construções. E recordarei, até, que, nas minhas primeiras colaborações neste jornal (foi o caso, por exemplo, da publicada em 01-11-2011), me ocupei de inscrições romanas encontradas em construções. É esse olhar perspicaz que se requer.
            ‒ O segundo prende-se com o facto de, em meu entender, não se trata apenas dessas estelas que deves considerar-se património, entendendo este como ‘signo identitário’: é o próprio valado de pedra seca! A meu ver, constituem esses valados uma marca deveras eloquente na paisagem, porque significam o sábio aproveitamento das pedras que pelos campos estavam e, além disso, são, com muita frequência, exemplo de uma técnica construtiva que não se deverá perder. Já se reparou que esses muros estão ali, sem cair, há muitas dezenas de anos?

Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 643, 15-07-2014, p. 12.

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