quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Na prateleira 12

Não sabe quem sou eu?
            E a senhora, dita da «sociedade» (pode usar-se a palavra inglesa, que é mais selecto…), abeirou-se do balcão. Interrogada se queria visitar a exposição de Maria Keil, respondeu que sim, claro. «Posso entrar?». «Sim, sem dúvida! É só um bilhete?».
            Perante a perspectiva de ter de pagar, embora nem sequer sonhasse quanto, perguntou à senhora da bilheteira se sabia quem ela era. Que sim, sabia, via-a amiúde nas revistas!...
            E então?         
               – Perdão!?          
               – Não tenho entrada de graça?
            Não tenho autorização para isso.
            Apeteceu-lhe acrescentar que ali não havia fotógrafos que a captassem em poses, a mostrar o vestido que lhe fora emprestado e os sapatos…
            E a senhora da «sociedade», sussurrando que determinada casa de chá da vila donde viera estava apinhada (percebe?) e a exposição, afinal, era um dó d’alma e compreendia-se porquê… (Se calhar, o chá não se pagava, e, ali, um chá de cultura conviria ajudar a pagar…), a senhora não entrou, não viu a exposição. Que maçada!
            Não sabe o que perdeu. Ou melhor, se calhar, mesmo que tivesse entrado, era capaz de não ter percebido o que ganhara. Desta vez, teve azar, errou no dia da… vernissage!...
 
Bonito, sim, mas…
            Visitei, há dias, magnífica musealização de ruínas romanas salvaguardadas sob o casario em pleno centro histórico de uma cidade.
            O projecto implicou o dispêndio de avultadas verbas e foi levado a cabo por mui conceituada equipa de especialistas.
            Abre ao público uma hora três vezes por semana, que é o período, se bem compreendi, em que tem furos nas aulas o estudante que disso ficou encarregado!

Um ano e… adeus1
Genoveva estava há um ano na casa e procurava ser empregada exemplar. Entretanto, engravidou. No dia em que completou um ano de trabalho, não lhe foi renovado o contrato.

O tom
            A maior parte das vezes, quezílias familiares, políticas e sociais nascem do tom. Esse é, aliás, um dos treinos maiores dos actores. Mais do que as palavras em si, o tom em que são proferidas – independentemente até do gesto ou da expressão facial – denuncia o que por detrás das palavras se esconde e que, amiúde, pode ser exactamente o contrário daquilo que se acaba de afirmar.
            Simples «bom dia!» permite, pela entoação, adivinhar entusiasmo, indiferença, mera boa educação, desprezo até…

Ele há gente para tudo!...
            Refiro-me não ao contingente que a seguir se comenta mas ao facto de, cada vez mais, haver quem maliciosamente ande a espiolhar ‘pormenores’ em que se nos esvai mui cinzento quotidiano…
            Assim, uma das mensagens que me caiu sob os olhos dava conta do quadro de pessoal da Câmara Municipal de Lisboa, publicado a 24-01-2013, no 2º suplemento ao Boletim Municipal nº 988 (este dado fui eu pescar, perante a notícia, no endereço http://www.cm-lisboa.pt/municipio/camara-municipal/recursos-humanos/mapa-de-pessoal).
            E admirava-se o autor da mensagem que houvesse a previsão de emprego para 2545 técnicos superiores, entre os quais (retiro eu do quadro publicado): 329 arquitectos, 303 juristas, 261 engenheiros civis, 154 licenciados em História, 144 licenciados em Ciências da Comunicação, 106 sociólogos, 101 assistentes sociais, 74 psicólogos, 48 geógrafos…
            Trata-se de uma grande Câmara, que desta forma dá emprego a muita gente. Comentava ironicamente o mal-intencionado autor da mensagem: decerto «trabalham todos arduamente para o meu município». Claro que sim! E ainda bem que há entidades empregadoras desta envergadura! Abençoadas! Venham mais! E com dinheirinho!

Publicado em Costa do Sol – Jornal Regional dos Concelhos de Oeiras e Cascais, nº 21, 06-11-2013, p. 6.

1 comentário:

  1. Antonio Alberto Andrade:
    É sempre enriquecedor para qualquer espírito ler o que escreve e tão bem descreve V. Excelência.

    E eu agradeço a gentileza das suas palavras, meu caro António.

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