sexta-feira, 3 de maio de 2013

A tua pasta dentífrica?

            Ele há coisas que a gente dificilmente esquece. Alguma injustiça de que fomos alvo, por exemplo.
Um dia, no recreio da Escola Salesiana do Estoril, no já bem longínquo ano lectivo de 1955-1956, um colega meu estava aflito porque não conseguia sair da retrete: a porta emperrara. Eu estava por perto, tentei empurrar com os ombros, mas a porta resistia. Teve de ser com forte golpe de pé. Passava nesse instante lá fora o Padre Caetano e não esteve com meias medidas: pregou-me valente carolo da cabeça! Ainda hoje o sinto! De nada me valeram as explicações; aliás, o meu colega já saíra e eu já apanhara o carolo!... Bastantes anos mais tarde, contei-lhe, sem rancor. Que Deus lhe tenha a alma em descanso!
            À recordação deste episódio junta-se sempre – é curioso! – um outro hábito da minha juventude: deliciava-me com as histórias das Selecções do Reader’s Digest. Eram histórias reais e ali se condensava, mesmo em singela narrativa, sabedoria de vida vivida – e eu gostava de aprender.
            Uma dessas histórias falava da pasta dentífrica Não sei se era texto a dar conselhos sobre a melhor forma de viver o dia-a-dia, escrito quiçá por conceituado psicólogo. Não sei. Recordo-me, porém, claramente – e disso acabei por fazer norma de vida – que, a determinado passo, o articulista propunha um desafio:
             Quer saber se é uma pessoa organizada? Vá à sua casa-de-banho e observe a sua pasta dentífrica!
             A minha pasta dentífrica?
             Sim, a pasta dentífrica.
            – Como assim?
            – Olhe para ela e veja como a usa. Se a vai esvaziando metodicamente, de baixo para cima ou se a esvazia como calha e a deixa toda aos altos e baixos…
            E não é que é verdade? Sem disso nos apercebermos, nestas minúsculas acções quotidianas fica a nossa maneira de ser bem retratada! Ao tomarmos consciência disso, estamos a tempo de, significativamente, também a alterarmos para melhor!

       Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 615, 01-05-2013, p. 12.

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